Reunião de detalhamento da Consulta PCT na Bakise Bantu Kasanje, em Mateus Leme | Foto: Camila Martins/Aedas
Indígenas, quilombolas, comunidades de religião ancestral de matriz africana, pescadores, entre outras tradicionalidades situadas na bacia do Paraopeba estão participando ativamente da definição e do detalhamento de projetos de reparação socioeconômica e dos estudos sobre a saúde da população atingida. Essas comunidades tiveram as suas rotinas e dinâmicas de vida afetadas pelo rompimento, que tirou a vida de 272 pessoas e gerou uma série de danos sociais, econômicos e ambientais.
“A união das três instituições de Justiça (Ministério Público de Minas Gerais, Ministério Público Federal e Defensoria Pública de Minas Gerais) e do Governo do Estado em uma atuação conjunta proporcionou a elaboração de um Acordo com medidas de reparação voltadas à região atingida e com garantias legais como a participação dos Povos e Comunidades Tradicionais”, destaca o promotor de Justiça Leonardo Castro Maia, do MPMG.
Entre as medidas voltadas às garantias de participação dos PCTs, foram verificados avanços importantes com a Consulta Popular específica para Povos e Comunidades Tradicionais, inserida no Programa de Reparação Socioeconômica do Acordo de Reparação; e os Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana (ARSH) para PCTs, projeto especial de reparação.
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Consulta Popular Específica para Povos e Comunidades Tradicionais
A Consulta Popular específica para Povos e Comunidades Tradicionais, realizada em 2022, contou com a participação de 45 comunidades, de 15 dos 26 municípios atingidos. Dentro do processo consultivo, os compromitentes assumiram o compromisso de selecionar ao menos um projeto por município, para aqueles que tivessem ao menos uma comunidade autorreconhecida como PCT participante.
O processo participativo está previsto no Acordo Judicial de Reparação e ocorreu posteriormente à Consulta Popular para a população geral dos 26 municípios atingidos, realizada em novembro de 2021. O processo contou com a participação de mais de 10 mil pessoas e contribuiu para a definição de mais de 160 projetos de fortalecimento do serviço público para a região, com 96 deles já em execução.
Na Consulta para PCTs, as lideranças comunitárias realizaram o processo de priorização, por meio de formulário específico, e encaminharam para os compromitentes, com o apoio das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs).
Ao longo do ano de 2023, a partir da priorização das políticas públicas apontadas pelas comunidades participantes, foram definidos mais de 30 projetos, posteriormente validados pelas comunidades contempladas. Com o apoio das ATIs, as comunidades elaboraram documentos orientativos específicos de cada uma, apontando as principais demandas e necessidades em relação aos projetos em elaboração.
Gradualmente, os projetos passaram para a fase de detalhamento – um planejamento, realizado pela Vale S.A. enquanto obrigação de fazer prevista no Acordo Judicial, que envolve a definição do desenho completo do projeto, ou seja, o escopo, os custos, o cronograma, entre outras informações.
“A consulta de forma específica para os Povos e Comunidades Tradicionais, referente aos anexos I.3 e I.4, foi uma grande conquista dos PCTs, pois nela está sendo considerado o que prevê a Convenção nº 169 da OIT, o direito e o respeito à consulta livre, prévia, informada, consentida e de boa-fé. O processo está se dando por diversas etapas, sempre em respeito e conformidade à legislação internacional que resguarda o direito aos Povos e Comunidades Tradicionais”, explica a coordenadora da Equipe de Povos e Comunidades Tradicionais da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), Beatriz Borges.
Os municípios atingidos que vão receber projetos da consulta específica são: Betim, Brumadinho, Esmeraldas, Florestal, Fortuna de Minas, Igarapé, Juatuba, Mário Campos, Mateus Leme, Papagaios, Pará de Minas, Paraopeba, Pequi, Pompéu e São Joaquim de Bicas.
“Na etapa atual, estamos realizando as primeiras reuniões para elaboração do Formulário de Detalhamento de Iniciativa (FDI) com a Vale, o Comitê Pró-Brumadinho, a Aedas [nas comunidades atendidas por esta ATI] e a comunidade, onde está sendo firmado o entendimento sobre como os projetos devem ser executados e qual a melhor viabilidade para cada um deles”, conta a coordenadora Beatriz Borges.
Foram realizadas, entre novembro e dezembro de 2023, 24 reuniões presenciais de detalhamento com as comunidades participantes. Entre as comunidades onde já foram realizadas reuniões, está a aldeia indígena Katurãma, dos Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe, localizada em São Joaquim de Bicas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. O projeto previsto para o local é um centro de referência em comercialização de produção artesanal e agrícola, que está sendo chamado pela comunidade de Pataxópping.
"Os projetos estão sendo elaborados com as contribuições diretas das comunidades, em um processo participativo intenso. A equipe do Comitê Pró-Brumadinho tem acompanhado praticamente todas as reuniões, visando esclarecer as etapas e fluxos, bem como garantir que as demandas e as necessidades apontadas pelas pessoas atingidas sejam incorporadas aos projetos. Com o respeito à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) e a presença nos territórios, esperamos garantir o atendimento às demandas dos PCTs e entregar projetos robustos, consistentes e aderentes à reparação socioeconômica de danos causados pelo rompimento”, explica o secretário-adjunto de Planejamento e Gestão do Governo Estadual e coordenador do Comitê Pró-Brumadinho, Luís Otávio Milagres de Assis.
Em Brumadinho, quatro comunidades quilombolas estão participando do processo: Marinhos, Ribeirão, Rodrigues e Sapé. A previsão é que sejam implantados quatro centros culturais, um em cada comunidade, com o objetivo de garantir o fortalecimento cultural, social e econômico do território. Também há projetos relacionados à educação, à infraestrutura e ao acesso à água em planejamento nos outros municípios da Bacia do Paraopeba. Todas as etapas previstas no processo participativo foram e devem ser realizadas com observância aos protocolos de Consulta Livre, Prévia e Informada das comunidades.
Em conformidade com a Lei Estadual nº 21.147/2014, o Decreto nº 6.040/2007, e a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, são considerados PCTs: “[o]s grupos culturalmente diferenciados que se reconhecem como tais e possuem formas próprias de organização social, ocupando territórios e utilizando recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica e aplicando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição" (Decreto Federal nº 6.040/2007).
Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana
Os Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana para Povos e Comunidades Tradicionais (ARSH-PCTs) estão sendo desenvolvidos com base em um projeto detalhado que leva em consideração as especificidades e singularidades desta população e a observância aos protocolos de consulta existentes, além do direito à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) e o necessário reconhecimento, valorização e o respeito à diversidade socioambiental e cultural desses Povos e Comunidades.
Até o momento, foram mapeadas cerca de 80 comunidades tradicionais para participar destes estudos. No caso dos Estudos de Risco, foi feito um mapeamento preliminar no território, englobando todos os Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) que estão inseridos nas Áreas-Alvo da pesquisa.
Os Estudos de ARSH-PCTs pretendem identificar a existência ou não de risco, considerando aspectos ligados à saúde populacional das comunidades tradicionais a serem avaliadas, expostas ao rejeito associado ao rompimento das barragens da Vale S.A. em Brumadinho. Caso sejam identificados riscos, os estudos vão indicar as medidas a serem implementadas pela empresa e pelo Poder Público para que os riscos sejam eliminados ou mitigados. Os estudos e a execução das medidas de reparação que forem de responsabilidade da Vale, serão acompanhados pela Auditoria externa independente.
“Os Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana são um instrumento fundamental para identificação dos riscos à saúde no território atingido. A partir dos resultados desse estudo, conseguiremos construir respostas ainda mais efetivas para o processo de reparação em saúde”, afirma o secretário de Estado de Saúde, Fábio Baccheretti.
Além disso, a execução deste projeto vai contribuir para o desenvolvimento posterior de estudos de saúde pública e medidas adicionais de saúde no território impactado, conforme descrito nas diretrizes do Ministério da Saúde (MS, 2010). Os estudos vão levar em consideração todas as normas e determinações relacionadas aos povos e comunidades tradicionais.
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